Nasci em um destes casarões esquecidos.
Já caídos.
Rendidos ao descaso.
Sou mulher forjada nas necessidades daquela menina
Que o cais do Porto vira crescer.
Sou mulher forjada nas cheias do Kiri-Kerê.
Sou mulher forjada nestas águas doces d’Oxum.
Sou mulher forjada no sal que o mar trouxe.
Sou mulher forjada no sal das lágrimas de minha mãe.
Sou mulher,
Mas também sou rio.
Sou cais dourado ao entardecer…
Sou a luta de um povo por respeito.
Sou descendente desta gente
Que aqui fora obrigada a aportar
E, so-bre-vi-ver.
Sou mulher,
Mas também sou ventania nos oitizeiros do Cricaré.
Sou lua cheia iluminando o rio
Em paisagem jamais vista.
Sou palmeira verdejante,
Mas também sou Igarapé.
Sou mulher e sou menina.
Sou professora
E sou poeta.
Sou Sítio Histórico abandonado.
Sou o lamento da ventania em noite silenciosa.
Sou o Largo do Chafariz, testemunha inerte da nossa história.
Sou pedra
E sou ladeira.
Vou para cima e para baixo.
Sou ruas estreitas.
Becos esquecidos.
Pés no chão da criança carente.
Sou as lágrimas da minha gente.
Sou garça alegre ou triste.
Sou menina e sou mulher.
Aqui no Porto de São Mateus,
Posso ser quem eu quiser.
